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VOCÊ RH - Ele passa a bola

12/01/2010 14:12

Ao adotar a delegação como estratégia de negócio, Marco Kerkmeester, dono do Santo Grão, ganha hoje cada vez mais e trabalha cada vez menos 

Parar de trabalhar. Aos 43 anos, o neozelandês Marco Kerkmeester, fundador da rede de cafeterias Santo Grão, um dos maiores sucessos da gastronomia paulistana dos últimos tempos, não esconde que essa é a meta que pretende alcançar ainda antes dos 50. “Quero aproveitar a vida no país que escolhi para criar meus filhos”, diz ele. Ex-executivo de marketing da IBM, Kerkmeester morava em Singapura e passava o tempo circulando por 15 países na Europa e na Ásia. Sua vida começou a mudar dentro do avião. Em 2000, durante um dos muitos voos que fazia entre os dois continentes, ele conheceu a brasileira Renata Esteve, hoje sua mulher, mãe de seus dois filhos (Lucila, de 6, e Nicolas, de 4 anos) e diretora financeira da rede. 

No ano seguinte, Kerkmeester veio ao Brasil pedir a mão de Renata em casamento. Encontrou um país pelo qual se encantou imediatamente. Ficou ali decidido que o casal se mudaria para o Brasil e ele estaria livre para encontrar uma nova atividade profissional. “Eu até poderia voltar a trabalhar numa grande empresa, mas estava cansado daquela vida. Eram nada menos que 40 horas por semana dentro de aviões”, relembra. Os primeiros quatro meses no Brasil foram dedicados a aprender o idioma e a prospectar o mercado em busca de ideias de possíveis negócios. 

A inspiração veio na primeira vez em que Kerkmeester voltou à Nova Zelândia. “Percebi o quanto sentia falta do café de lá e como era difícil encontrar um bom café no Brasil”, afirma. Com o negócio em mente, o próximo passo era partir para o conceito — e aí ele apostou na sofisticação. A primeira unidade foi aberta em agosto de 2003, bem no burburinho dos Jardins, na Rua Oscar Freire. O ambiente acolhedor, com janelões e poltronas confortáveis, e a flexibilidade do horário (abrem no meio da manhã e só fecham as portas no início da madrugada) conquistaram imediatamente o público, que faz fila na porta para pagar uma xícara de expresso a 4,20 reais. 

O sucesso do negócio para Kerkmeester, porém, não está apenas no luxo, mas sim nas pessoas que fazem parte de seu time. Foi por elas que ele achou o caminho da expansão. Nada de abrir franquias ou vender a casa para alguma rede famosa. Isso, segundo ele, não manteria o clima do Santo Grão, que tanto atrai a clientela. Decidiu, portanto, que bancaria inteiramente todo o investimento de cada nova filial e convidaria um funcionário a se tornar sócio, com o lucro sendo dividido meio a meio. Esse método foi aplicado nas duas novas casas, no Shopping Cidade Jardim e na Vila Madalena, e também no novo negócio do grupo, a marca própria de café. Graças à ideia, ele está trabalhando não mais do que oito horas por semana, consumidas em rápidas reuniões com os sócios — aos quais dá plena autonomia para as decisões do dia a dia. “Meu cotidiano é uma delícia. Trabalho pouco, convivo com meus filhos e ganho o suficiente para viver bem”, diz. 

Para chegar a esse estágio invejável, Kerkmeester teve de exercitar um verbo que o mundo corporativo conhece bem na teoria e pouco na prática: delegar. “Minha regra número 1 é a seguinte: sempre que eu puder passar minhas responsabilidades para os outros, assim será feito”, afirma. Ao selecionar seus funcionários (e sócios em potencial, por consequência), ele busca principalmente duas características: interesse em aprender coisas novas e empatia pessoal. “Basicamente meu teste de seleção é tomar um café com a pessoa e sentir se foi um encontro agradável.” Hoje, cada um dos 120 funcionários sabe que tem chances reais de crescer — mesmo os pouco experientes. “Os jovens têm mais energia e paixão e estão mais conectados com o mercado do futuro”, diz o dono do Santo Grão. Danilo Carlos dos Santos, de apenas 24 anos, é a prova das apostas de Kerkmeester. Hoje sócio da filial da Vila Madalena, inaugurada em 2008, ele foi contratado como barista na matriz, embora jamais tivesse preparado um café. O que sinalizou para Kerkmeester que a contratação daria certo eram a alegria e o entusiasmo do jovem desde o primeiro momento. “Um dia, ele me chamou para uma conversa e eu achei que seria despedido”, lembra Santos, entre risos. “Mas naquela hora fui convidado a virar sócio.” Apesar de ter sido pego de surpresa, ele topou na hora e hoje lidera uma equipe de seis pessoas. 

Outro exemplo é a diretora de marketing da rede e sócia da marca de café, Vanessa Mills, de 29 anos. Em 2002, depois de se formar em publicidade e propaganda, ela decidiu passar um ano estudando inglês na Nova Zelândia. Para pagar o curso e se manter, começou a trabalhar como barista numa cafeteria — foi quando entrou em contato com a tradição neozelandesa do café. De volta ao Brasil, estava à procura de trabalho quando soube de um certo neozelandês que acabara de inaugurar um café em São Paulo. Foi conhecer a casa e conversou com Kerkmeester, que a contratou para o único cargo que tinha à disposição naquele momento: garçonete. Quando veio a ideia de lançar uma marca própria de café, Vanessa foi convidada para ser sócia e assumir o departamento de marketing. Ela cuidou de todo o desenvolvimento do produto — da embalagem à negociação com os pontos de venda. “Tem sido um aprendizado fantástico”, diz ela. 

Com exemplos assim, fica fácil entender por que a rede recebe hoje cerca de 300 currículos por mês. Isso forçou há dois anos a formação de uma área de recursos humanos, comandada por Fabíola Melo, de 26 anos, que também começou como garçonete. É ela hoje a responsável pela seleção dos colaboradores, um trabalho constante, que não depende das vagas em aberto e começa exclusivamente pela internet. Os candidatos mandam o currículo para o site da empresa e os pré-selecionados respondem, por e-mail, a uma espécie de pré-entrevista. Quem passa é chamado para uma conversa pessoal. 

Fabíola realiza entre 20 e 25 entrevistas por semana. Desses candidatos, costuma aprovar entre sete e dez, e vai abastecendo o banco de reservas das lojas. Como critério de avaliação, segue à risca a recomendação do dono e avalia, sobretudo, a empatia na hora de entrevista. Quem tem salto alto e espera logo assumir cargos de chefia também não é bem-visto. “A ideia é que as pessoas cresçam aqui dentro”, diz Fabíola. Para dar suporte a esse crescimento, a empresa hoje banca a universidade de três funcionários e em 2009 patrocinou um curso de neurolinguística para outros 12, benefício que deve ser estendido para mais 20 pessoas. 

Seguindo o método da delegação, a estratégia de Kerkmeester é crescer pelo menos 30% ao ano, expandindo inicialmente pela cidade de São Paulo até chegar ao interior do estado, ao restante do Brasil e — por que não? — ao exterior. “Do jeito que o negócio está desenhado, a Santo Grão pode crescer cada vez mais e eu trabalhar cada vez menos. Existe fórmula melhor que esta?”, questiona. Dificilmente alguém irá duvidar.

Por Maurício Oliveira

Fonte: https://revistavocerh.abril.com.br/noticia/conteudo_524389.shtml

 

 

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